quarta-feira, 31 de março de 2010

Eleição Indireta. Cidadania Quebrada?

por Felix Palazzo, ex-Vice-Presidente da OAB/DF

Os brasilienses estão muito atentos aos desdobramentos da crise política que se instalou em Brasília. A envergadura da crise levou a Procuradoria da República a requerer, perante o Supremo, a intervenção no Distrito Federal. A rápida modificação da Lei Orgânica, para permitir de imediato a eleição indireta, bem demonstra que os Deputados Distritais estão atentos aos reclamos da cidadania. Ao mesmo tempo, malgrado não possam impor, sob pena de malferir a Constituição, proibição a que deputado distrital concorra ao cargo de Governador, já se aperceberam os Deputados que insistir na liberalidade aumenta os riscos de que a intervenção venha a ser aceita pelo Supremo.

Por outro lado, há indicativos de que alguns Distritais desejam restringir a participação de candidatos que não tenham, no mínimo, um ano de filiação partidária, o que restringe a participação de terceiros, mas reforça a dos próprios distritais. A se confirmar tal regra, além de reavivarem a ameaça de intervenção, estarão cometendo grave violação constitucional.

A Constituição Federal, em seu artigo 14, dispõe, entre outros incisos, que a filiação partidária é condição de elegibilidade. No que importa verificar, não há na Constituição qualquer imposição para que a filiação partidária seja de, no mínimo, 01 ano. No entanto, a lei 9.504/97 dispõe em seu art. 9º que “para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de, pelo menos, um ano antes do pleito e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo”. Por conta da literalidade, a Câmara Legislativa aponta no sentido de exigir a filiação partidária de um ano como condição de elegibilidade. Engano esférico, a meu sentir.

De efeito, as regras da Lei 9.504/97 são para as eleições ordinárias. Tanto é assim que dispõe o seu art.1º: “As eleições para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, dar-se-ão, em todo o País, no primeiro domingo de outubro do ano respectivo”. Já na parte que grifamos é possível perceber que as regras ali tratadas dizem respeito às eleições ordinárias, inclusive se estabelecendo a data em que as mesmas se realizarão. Confirmada na lei tal proposição, daí decorrem todos os demais prazos para que os pretensos candidatos adquiram as condições de elegibilidade, inclusive no que toca à data da realização das convenções partidárias, que segundo o art.8º, da mesma lei, deve ser dar no período de 10 a 30 de junho do ano em que se realizarem as eleições. Ou seja, é prazo que desde já não pode ser observado na eleição indireta, eis que a própria eleição está marcada para o dia 17 de abril. Mas não é só!

Há também que reafirmar que a legislação em referência é específica para as eleições ordinárias, tome-se ainda o que diz o art. 11: “ Os partidos e coligações solicitarão à Justiça Eleitoral o registro de seus candidatos até as dezenove horas do dia 5 de julho do ano em que se realizarem as eleições”. Rápida leitura da Lei 9.504/97 exporá tantas outras condições da mesma espécie. Retorne-se, agora, à questão específica do prazo mínimo de um ano de filiação. Como já se disse, a Constituição não o exige. É exigência da Lei Ordinária. Ainda assim, essa Lei Ordinária não exige do candidato que apresente a prova da filiação partidária de “pelo menos um ano” no ato do pedido de registro. Ou seja, as condições de elegibilidade no que toca ao prazo de filiação partidária não são absolutas, já que para os militares e membros de Tribunais de Contas, por exemplo, o prazo de filiação partidária é de apenas seis meses. Ora, sendo os prazos de que trata a Lei 9.504/97 os que balizam as regras eleitorais ordinárias, somente é de se exigir, para fins de registro da candidatura em eleição indireta, as condições de elegibilidade previstas na Constituição Federal, não incidindo, por incompatíveis, as demais condições de elegibilidade prevista na lei ordinária, como por exemplo, o prazo de filiação partidária. A eventual recusa a tal entendimento impõe a que o Ministério Público, como fiscal da lei, recomende à Câmara que admita para a eleição indireta o registro de candidatura de todos quantos estejam aptos ao pleito de 2010, observada a indicação pelos partidos. Espera-se, no entanto, que nesse difícil quadro político, a Câmara Legislativa, ao elaborar os preceitos para a eleição indireta, adote orientação compatível com a Constituição.

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